A possibilidade de resistência e a importância da organização e mobilização popular foram alguns dos temas abordados na palestra de Anita Leocádia Prestes, filha de Luís Carlos Prestes e Olga Benário Prestes, na última na terça-feira, 19 de setembro. A historiadora esteve na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para o lançamento de seu novo livro, “Olga Benário: Uma Comunista nas Mãos da Gestapo”, publicado pela Editora Boitempo. Em um auditório cheio, Anita explicou os motivos e contexto de produção da obra, relembrou as atrocidades cometidas durante o nazismo na Alemanha, e discorreu também sobre o momento político atual.
Para Anita, um dos principais ensinamentos que a vida de Olga deixou para as gerações que a sucederam foi sua capacidade de resistência. “Resistir sempre é possível. Até em campo de concentração ela resistia. Era tudo proibido, mas ela e as outras prisioneiras se reuniam clandestinamente, organizavam círculos de estudos, discutiam o panorama da guerra, estudavam línguas, faziam ginástica. Elas tinham uma disciplina interna muito rígida, que incluía uma série de medidas para que conseguissem sobreviver e resistir. Isso foi muito importante.”
Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSc.
A personalidade firme, combativa e organizadora de Olga, em um dos piores momentos políticos da história, foram ressaltados por Anita, que fez uma relação com os dias de hoje: “As experiências fascistas surgiram na Europa em uma época de grande crise do capitalismo. E isso está se repetindo. O perigo fascista não está excluído. É importante que as novas gerações, os jovens, estejam atentos para essas questões. O exemplo da resistência de Olga – e não só dela, mas também dos comunistas, anti-fascistas, democratas e todos os outros que resistiram naquela época – mostra que é possível se organizar mesmo nas condições mais adversas. Um regime como o nazista não se detinha diante de nada para realizar as maiores barbaridades.”
A convicção na causa é, segundo Anita, fundamental para essa resistência. “Meu pai, Luis Carlos Prestes, sempre dizia que tanto ele como Olga conseguiram resistir porque tinham convicção da justeza da causa pela qual lutavam, que era a causa do socialismo e do comunismo. Se não tivessem essa convicção, não conseguiriam passar por tudo que passaram. Isso também é um exemplo para nós: a importância de se ter convicção na luta que se trava. A luta pela transformação social é muito difícil. Só com muita convicção é que realmente conseguimos seguir adiante.”
Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC.
Organização popular
Anita criticou a falta de organização e mobilização popular nas lutas contemporâneas. “Lamentavelmente nós, povo brasileiro, estamos muito desorganizados. Vivemos um momento de retrocesso político muito grande. E esse não é um fenômeno só brasileiro, mas sim um fenômeno mundial. Passamos por um período de avanço das forças reacionárias, retrógadas e fascistas. A crise do capitalismo é grave e não se trata apenas de uma crise cíclica, é uma crise do sistema. E isso leva a burguesia a recorrer a medidas autoritárias e à repressão de setores populares, que evidentemente lutam e se revoltam contra a situação. Mas falta organização popular.”
A historiadora afirmou que as lideranças de esquerda no Brasil hoje não dão a devida importância à necessidade dessa organização, mobilização e conscientização popular: “Eu não vejo essa preocupação por parte das chamadas esquerdas existentes hoje. Esse é um trabalho difícil, penoso, feito a longo prazo. Mas se a gente não começa, nunca vai ter resultado. É preciso organizar os diferentes setores populares em torno das suas reivindicações. Ninguém se organiza para lutar pelo socialismo ou pela revolução, as pessoas se mobilizam para lutar por suas reivindicações. E o que não falta hoje é reivindicação. Os problemas estão aí. Quem está realmente interessado em fazer as lutas populares avançarem no Brasil deve trabalhar nessa direção: tentar organizar os setores populares. Nesse processo, as pessoas vão ganhar experiência, vão sentir a necessidade de estarem mobilizadas e serão conscientizadas de que os problemas colocados pelo capitalismo não têm solução definitiva dentro do capitalismo. A única solução é o socialismo.”
Foto: Henrique Almeida/Agecom/UFSC
As manifestações de 2013 mostram, segundo ela, que sem organização não há conquistas. “Massa desorganizada na rua não dá resultado. Acho que um dos motivos para a desmobilização existente hoje foi a forma como se deram aquelas grandes manifestações de 2013. A maioria dos brasileiros estavam extremamente insatisfeitos e foram para a rua protestar. Mas estavam desorganizados. Voltaram todos para casa e qual foi o resultado daquilo? De lá pra cá a gente só viu a situação piorar, se agravar. Por isso eu digo: povo desorganizado não resolve. Infelizmente a mobilização popular no Brasil hoje é muito débil.”
Anita também apontou as recentes perdas de conquistas históricas dos trabalhadores. “O povo brasileiro está enfrentando um momento muito difícil, fruto desse golpe jurídico-parlamentar ocorrido ano passado. O Temer, que podemos considerar um usurpador do poder, se instalou lá e não quer sair de jeito nenhum. Isso foi um golpe e cada vez está mais claro que o objetivo é o de liquidar com todas as conquistas de direitos dos trabalhadores do Brasil, como a CLT e a previdência. Todas as conquistas, que foram fruto de anos de lutas do povo brasileiro, estão sendo liquidadas. A Petrobras, que também foi uma grande conquista, está sendo retalhada. O país está sendo vendido aos pedaços para o capital estrangeiro. É uma política profundamente anti-nacional, anti-popular”, afirmou, reiterando a necessidade de se organizar para combater todos esses problemas.
Daniela Caniçali/Jornalista da Agecom/UFSC